17012021

O Titanic nos Tempos Da Belle Époque

O Titanic representava um marco do domínio do homem sobre a natureza na era industrial, um símbolo da Belle Époque, da modernidade do século XX. A primeira classe do navio recriava ambientes dos lugares mais chiques da França neste período. O futuro parecia haver finalmente chegado e as invenções tecnológicas ditavam o ritmo de uma nova era. A eletricidade, o telégrafo sem fio, o cinema, a bicicleta, o automóvel e o avião inspiravam o surgimento de um novo mundo.

Neste contexto, o Titanic representava os avanços da ciência e o poder do homem que acabara criando o maior objeto móvel até então construído. Talvez, o navio tenha até representado uma ruptura ideológica antes mesmo da que viria com a Primeira Guerra Mundial, que pôs fim aquela sociedade que por pouco tempo pareceu perfeita.

Diante do grande avanço tecnológico pelo qual passava a burguesia industrial, a Europa dominava o restante do mundo, porém a desigualdade social viria a fazer parte deste processo: De um lado, as grandes elites, do outro, a massa dos trabalhadores insatisfeitos em decorrência das péssimas condições de trabalho a que eram submetidos. Como consequência, surgiram movimentos artísticos e políticos que representaram o sentimento de oposição revelando seus interesses ideológicos por meio de uma verdadeira radicalização no campo da cultura e das artes como um todo. Manifestações artísticas estas, que se materializaram pelo Futurismo, Cubismo, Dadaísmo, Expressionismo e Surrealismo que, posteriormente, deram origem ao Modernismo brasileiro.

Dados esses acontecimentos, o conceito Futurista que surge em 22 de Fevereiro de 1909 por meio do Manifesto Futurista, sob a autoria do italiano Tommaso Marinetti, publicado no jornal Le Figaro, o mesmo ano em que se iniciou a construção do navio. O movimento exaltava a vida moderna, a máquina, a velocidade. Reivindicava uma ruptura com o passado buscando novas formas, assuntos e estilos, que melhor representassem a modernidade.

Assim, os navios idealizados no século XX eram frutos do poder imperial inglês os quais uniam a mais recente tecnologia com a lendária reputação britânica de dominadora dos oceanos. “Suas gigantescas dimensões, a potência de seus motores turbinados, o luxo de suas instalações mostravam ao mundo a grandeza da nação que lhe dominava os mares”, descreveu o autor Sergio Faraco em sua obra “O Crepúsculo da Arrogância”.

Na época, os transatlânticos travavam uma disputa por passageiros, transporte de carga e correspondência entre os continentes. Devido a este último pressuposto a sigla RMS (Royal Mail Ship) é um prefixo usado em navios mercantes britânicos contratados pela Royal Mail, ou seja, o Titanic era oficialmente responsável pela entrega de correio para o serviço postal, no entanto este serviço não tinha relação com a White Star Line, sendo que a companhia recebia pelo serviço de correio pelo governo inglês. Entre os principais quesitos levados em conta na construção das embarcações incluíam rapidez e conforto. No começo de 1900, duas grandes companhias – a Cunard Line a White Star Line – disputavam a supremacia no Atlântico Norte no transporte de passageiros e quem realizava a travessia mais rápida. A Fita Azul do Atlântico era o prêmio outorgado somente aos navios mais rápidos do planeta.

Foi então que em 1902, John Pierpont Morgan, magnata norte-americano, financiou a formação de Internacional Mercantile Marine Company, um transporte náutico pelo Atlântico que absorveu várias das principais linhas americanas e britânicas. Uma das subsidiárias da IMM foi o White Star Line que detinha o RMS Titanic. O proprietário visava dominar o tráfico marítimo do Atlântico Norte e para que Morgan não se apoderasse da Cunard Line, como fez com outras companhias britânicas, a companhia origina a dupla RMS Mauritânia, que pelos vinte e dois anos seguintes seria o transatlântico mais rápido do mundo, e o Lusitânia, os maiores do mundo até então e detentores do prêmio Fita Azul.

Em 30 de Abril de 1907, durante um jantar na mansão de William Pirrie, presidente do estaleiro Harland & Wolff e Joseph Ismay, presidente da White Star Line, propõe a construção de três grandes transatlânticos para concorrer com os vapores da Cunard. Esses navios partilhavam um projeto e um tema em comum: a grandeza. Estes navios explorariam a ligação marítima de passageiros entre o velho mundo e a América.

O Titanic, portanto, nasce num período de grande avanço tecnológico onde grandeza, luxo e conforto eram sinônimo de poder e prestígio para os países que participavam dessa corrida industrial. No entanto, a pressa de querer competir e dominar o mercado marítimo acabou sendo fatal para a White Star Line que teve o destino dois de seus transatlânticos no fundo do mar.

29102021 (1)

O Racismo Presente Nas Músicas Sobre O Titanic

No final dos anos 1960, a explosão da popularidade do rádio FM underground permitiu a transmissão de canções de uma duração que antes era inimaginável no rock (e, na maior parte, no folk). O (Alice’s Restaurant Massacree) de 18 minutos de Arlo Guthrie, mais popularmente conhecido simplesmente como (Alice’s Restaurant) pode ter sido o mais conhecido deles, seguindo um formato folk-blues solto e falante para retratar um divertido cachorro peludo de uma história.

Um pouco menos lembrado, embora também um grande favorito da FM em sua época, é (Legend of the U.S. Titanic) de Jaime Brockett, de 13 minutos. Como o (Alice’s Restaurant), também seguia um formato folk-blues falante e trazia referências contraculturais conhecidas. Ao contrário de Guthrie, no entanto, Brockett foi incapaz de desenvolver sua maratona de monólogo para sustentar uma longa carreira como artista musical. Na verdade, (Legend of the U.S.S. Titanic) nem era muito típico de seu trabalho, o resto de seu álbum de estreia inclinado para baladas folk introspectivas. Foi (Legend of the U.S.S. Titanic), no entanto, que a maioria dos ouvintes comprou o LP.

A música faz referência a Jack Johson, um boxeador americano que entrou para história ao ter se tornado o primeiro boxeador negro campeão mundial dos pesos-pesados, título este que foi conquistado em 1908 e mantido até 1915. A letra conta que Jack embarcaria no Titanic, mas teria sido impedido por um dos oficiais por conta de sua cor de pele.

No entanto, a história não é verdadeira. Em abril de 1912, quando o Titanic zarpou, Johnson estava nos Estados Unidos, provavelmente em sua cidade natal, Chicago, tentando arranjar uma luta pelo título naquele verão e se preparando para abrir sua boate lá, o Café de Champion, que abriu em julho. Johnson havia passado o outono anterior na Inglaterra e na França lutando em partidas de exibição, mas retornou a Nova York pouco antes do Natal de 1911 a bordo do navio Lloyd Kronprinzesen Cecille.

Poucos dias depois do naufrágio do Titanic, ele anunciou uma luta com Jim Flynn. Isso aconteceu em Las Vegas em 4 de julho de 1912. Sua biografia não menciona nenhum problema em conseguir uma vaga em navios no White Star ou qualquer outra linha, como também foi mencionado na letra da canção de blues (The Titanic), de Lead Belly.

Ambos os artistas provavelmente escolheram a figura de Jack Johson que na época estava em seu auge para representar em suas composições o racismo que os negros sofriam na época de forma muito mais intensificada e escancarada.

Até o momento não se tem registros se de fato algum passageiro no Titanic foi vítima de racismo ou qualquer outro tipo de discriminação, mas infelizmente não seria algo de se espantar uma vez que desde o inicio das grandes navegações e a escravização de negros na África, esse olhar de superioridade e inferioridade racial se tornou muito presente entre a burguesia europeia principalmente a partir do século XIX. O Titanic sendo uma representação marcante do que era a sociedade naquela época, é muito provável que situações infelizes como essas ocorreram inúmeras vezes dentro e fora do navio já começando pela segregação dura que existia entre as classes sociais.

Mesmo após 100 anos, a luta dos menos favorecidos dentro do (Capetalismo) persiste. É claro que evoluímos muito desde 1912, mas a herança discriminatória da escravidão (todas as relações com base na ideia de inferioridade dos negros que foram transmitidas) em conjunto com a falta de medidas e ações que integrassem os negros e indígenas na sociedade, como políticas de assistência social ou de inclusão racial no mercado de trabalho, gerou o que se entende por racismo estrutural, ou seja, uma discriminação racial enraizada na sociedade.

Isto é, o racismo estrutural não diz respeito ao ato discriminatório isolado (como xingar pejorativamente alguém por conta da cor da sua pele) ou até mesmo um conjunto de atos dessa natureza.

Ele representa um processo histórico em que condições de desvantagens e privilégios a determinados grupos étnico-raciais são reproduzidos nos âmbitos políticos, econômicos, culturais e até mesmo nas relações cotidianas. Para entender mais sobre o assunto eu recomendo a leitura do livro (Levanta Favela, Vamos Descolonizar o Brasil) da autora Flávia Pinto.

Música (Legend of the U.S. Titanic): https://www.youtube.com/watch?v=4XFYMjkFYPg
Tradução da letra (Legend of the U.S. Titanic): https://genius.com/Jamie-brockett-legend-of-the-uss-titanic-lyrics
Música e tradução da letra (The Titanic): https://www.encyclopedia-titanica.org/leadbelly-titanic.html

090821

Sobrevivente do Titanic, Violet Jessop

Enquanto estava escovando os meus dentes, tentando me livrar do óleo e da poeira da cortiça, ouvi uma batida na porta. A assistente da enfermeira-chefe olhou para dentro da cabina. Ela evidentemente pensou que seria desnecessário congratular-se comigo por eu estar viva, ou ainda indagar se eu estava machucada. Ao contrário, perguntou, ( Onde foi que você conseguiu a escova de dentes ? ) Eu respondi num tom de voz baixo receando que com o esforço despedindo poderia vomitar. ( Eu trouxe comigo ). O seu olhar de assombro e desconfiança levou-me a pensar se ela imaginava que eu estava aliada com o inimigo e tinha preparado alguns pertences para um final de semana, antes de entrar no bote salva-vidas.

Este trecho compõe a sinopse do livro ( Titanic Survivor The Memoirs of Violet Jessop ) ou ( Sobrevivente do Titanic Violet Jessop ), traduzido para o português do autor John Maxtone-Graham. A obra é uma coleção de memórias de Violet Jessop, a comissária de bordo que estava presente na colisão do Olympic com o cruzador Hawke e que sobreviveu aos naufrágios do Titanic e do Britannic, todos da White Star Line.

Violet escreveu suas memórias em 1934 e John Maxtone-Graham as editou e comentou para publicação do livro. Historiador marítimo, ele é autor de muitos clássicos sobre navios de passageiros e teve a oportunidade de entrevistar Violet em 1970, enquanto pesquisava detalhes para outro livro de sua autoria chamado ( The Only Way to Cross ). A ex-comissária morreu um ano mais tarde, deixando os manuscritos para suas sobrinhas. Provavelmente se não fosse por John, ninguém jamais conheceria a história fascinante de Violet Jessop que viveu uma vida de viagens incomuns e cheia de aventura.

Sua trama literária é ampla, pois além de testemunhar ocular do afundamento do Titanic e do Britannic, Violet Jessop nos tece histórias intrigantes, Comissárias amigas hilariantes, episódios grotescos nas cabinas, grito às armas na guerra, passageiros difíceis, companheiros de bordos cortejadores, portos exóticos, amor não correspondido e mortes trágicas.

O seu trabalho na companhia transatlântica White Star Line fez com que se tornasse personagem de dois épicos desastres marítimos. Ela foi salva do naufrágio do Titanic porque um oficial a mandou entrar no bote salva-vidas para que os imigrantes que não falava inglês pudessem seguir o seu exemplo. Já no Britannic, ela foi alertada por um de seus colegas de bordo para que embarcasse o mais rápido possível em um dos botes salva-vidas e assim ela o fez, no entanto, ainda precisou lidar com o desespero de quase ser sugada e triturada por uma das hélices do navio. Ao cair na água, foi atingida fortemente na cabeça e só não morreu afogada, pois um dos oficiais retornou para ajuda-la. Violet comenta o terror que foi se deparar com partes de membros ou mesmo órgãos flutuando no mar por conta das hélices que permaneceram funcionando até o momento do naufrágio.

Poucas são as comissárias de bordo que escreveram suas memórias, portanto, a história de vida de Violet Jessop é duplamente valiosa, única no gênero, além de altamente articulada e informativa é contada por alguém que fala com muita propriedade. De sua posição como comissária somos levados aos bastidores da vida da mulher a bordo de mais de cem anos atrás.

Esta é uma leitura obrigatória para todo entusiasta que se aventura em desvendar os mistérios e curiosidades que cerca a tragédia do R.M.S Titanic, não só pela riqueza das memórias transcritas, mas também para darmos mais valor e importância às histórias destes personagens ( coadjuvantes ) que merecem tanto o prestígio quanto a ( Inafundável ) Molly Brown ou mesmo Ida Straus. Certamente Violet Jessop é uma significativa representação dos passageiros da terceira classe e da tripulação em que todos compunham uma história, mas que muitas acabaram sendo ceifadas naquela noite fria de Abril.

010721

Projeto de Dados chamado Titanic Data Set

Um dos aspectos que mais me chamam atenção acerca da história do Titanic é o quanto ela expande ramificações para diversas áreas, pois ele é a própria cápsula do tempo que nos faz viajar para o passado nos mostrando um pouco do contexto histórico daquela época e o quanto a sociedade havia avançado em termos de tecnologia, filosofia, ciência, arte, música, literatura, moda e cultura. Se quiséssemos fazer um recorte desta história, ainda assim uma guarda chuva de possibilidades se abriria sendo possível aprender muito sobre um assunto específico.

E é pensando nessa dimensão interdisciplinar que o Titanic nos proporciona que escrevo hoje a respeito do projeto ( Titanic Data Set ) que exemplifica um pouco do trabalho que exerce um cientista de dados.

Como o próprio nome sugere, este projeto é composto por um conjunto de dados que fornece informações sobre todos os passageiros que estavam a bordo do RMS Titanic quando o malfadado navio afundou em de abril de 1912 após colidir com um iceberg.

Este é um conjunto de dados bastante popularizado entre estudantes de ciência de dados. Com 891 linhas e 12 colunas, ele traz uma combinação de variáveis ​​com base em características pessoais dos passageiros como idade, classe de ingresso no navio e gênero. Ao testar diferentes habilidades de classificação, o cientista de dados consegue prever a sobrevivência dos que estavam a bordo do Titanic em diferentes cenários.

O naufrágio resultou na morte de 1.500 dos 2.224 passageiros e tripulantes e embora houvesse algum elemento de sorte envolvido na sobrevivência, é evidente que alguns grupos de pessoas tinham mais probabilidade de sobreviver do que outros.

Neste desafio, o projeto pede aos usuários que construam um modelo preditivo que responda à pergunta ( Que tipo de pessoa tem mais probabilidade de sobreviver ? ) usando dados de passageiros, ou seja, nome, idade, gênero, classe socioeconômica, etc dos quais contém informações semelhantes, mas não divulga a verdade sobre cada passageiro, pois é seu trabalho prever esses resultados.

Usando os padrões encontrados nos dados, você precisa tentar prever se um passageiro sobreviveu ao naufrágio do Titanic ou não. A pontuação é a porcentagem de passageiros que você prevê corretamente, interessante, não ?

Para participar da competição, é importante assistir ao tutorial de como funciona a plataforma Kaggle ( https://encurtador.com.br/byIJX ) e depois acessar ao site ( https://encurtador.com.br/bloKO ) neste último link você também consegue acessar a planilha a qual está disponibilizada os dados coletados.

280521

Descoberta de Jornal sobre o Titanic por Victor Vila

Talvez um dos achados mais surpreendentes e realmente inesperados que já fiz até hoje…
Regularmente vou ao Sebo do Messias, que fica na Praça João Mendes no centro de São Paulo, para vasculhar sem compromisso e ver se encontro novos itens para minha coleção de Titanic e navios de passageiros. Eis que me deparei com uma pilha de jornais antigos, a maioria em francês, português de Portugal, alemão mas, principalmente, em espanhol. Os periódicos iam desde meados de 1870 a até a terceira década do século XX, todos relativamente bem preservados.

Fazendo uma triagem de volumes que teriam potencial para conter alguma noticia ou matéria interessante, encontrei um exemplar do espanhol ( La Ilustracion Artística ) datado de 22 de abril de 1912, exatamente uma semana após o naufrágio do Titanic! A capa não parecia ser muito promissora, mas eis que começo a folhea e me deparei com esta linda matéria em meia página, falando sobre o naufrágio e os desdobramentos do acontecido!

A fotografia em questão é do próprio Titanic ( não é o Olympic ) em janeiro de 1912 enquanto ainda era equipado nos estaleiros Harland and Wolff em Belfast. Trata-se de uma imagem muito rara do Titanic, que se tornou relativamente conhecida apenas depois de 2011 com a publicação do livro ( Titanic in Photographs ). No próprio livro, ela consta como vindo da coleção particular do autor, porém através deste jornal, temos a fonte original da imagem, proveniente da ( London New Agency Photo ).

De fato, esta é a primeira vez que vejo particularmente esta fotografia publicada em um artigo da época, o que torna este exemplar muito especial e agora com um lugar de destaque no meu acervo !

19042021

Impacto do Titanic Para A Segurança Marítima

Na última quinta feira, no dia 15 de Abril de 2021, uma das maiores e mais conhecida tragédias marítimas completou 109 anos.  O RMS Titanic se tornou um marco na história; antes dele os acidentes eram banais e depois passaram a ter mais importância já que o navio se tornou referência principalmente quando se trata de medidas de segurança. Afinal, a fama que acompanhou o Titanic durante seu período de construção era a de ser um navio livre de qualquer perigo. Tal acontecimento é um fato isolado da navegação visto que na mesma época existiam outros navios transatlânticos, como seus próprios concorrentes navegando na mesma rota do oceano e que não naufragaram.

Importante ressaltar que houve desastres marítimos maiores e mais mortais, porém nenhum ocupou o mesmo lugar na mente popular do navio como símbolo da incapacidade humana de controlar o universo, ainda que em posse da mais avançada tecnologia. Livros e filmes ajudaram a manter o público interessado pela tragédia, no entanto, outro século vai passar sem que saibamos toda a história, pois sempre é possível que surja um novo documento, ou depoimento, ou pesquisa com os restos do navio. Isso é só mais um dos elementos que garantem que o desastre continue sendo tão fascinante.

Como uma das consequências da tragédia, o naufrágio do Titanic foi responsável pelas primeiras mudanças na forma de construção e nas normas de proteção da vida no mar tendo sido catalisador para a adoção em 1914 da primeira Convenção Internacional para a Salvaguarda da Vida Humana no Mar ( Safety of Life at Sea, SOLAS ). Com a perda de mais 1.500 pessoas no desastre foram levantadas muitas perguntas sobre as normas de segurança em vigor e o Governo do Reino Unido propôs a realização de uma conferência a qual contou com a presença de representantes de 13 países para elaborar regulamentos internacionais que lidam com a segurança da navegação de todos os navios mercantes.

A Convenção tem por propósito estabelecer os padrões mínimos para a construção de navios, para a dotação de equipamentos de segurança e proteção para os procedimentos de emergência. Em resposta a grandes desastres, os países mudaram para a internacionalização da lei e posteriormente outras Conferências foram realizadas a fim de estabelecer não só regras de seguranças universais, mas a prevenção da poluição por navios no mar.

Desta forma, todos os navios construídos após a tragédia do Titanic deveriam ter botes salva vidas para todos a bordo, os telegrafistas teriam de trabalhar durante a noite ( na época, os operadores de rádio trabalhavam 16 horas e não tinham substitutos ), exercícios de emergência com os passageiros deveriam ser realizados e a Patrulha Internacional do Gelo foi criada em 1913 nos Estados Unidos para atuar no Atlântico Norte sob supervisão da Guarda Costeira, uma organização que monitora a posição de icebergs para garantir a segurança das embarcações.

Em uma das Conferências realizada em 1948, foi adotada pelas Nações Unidas a Organização Marítima Internacional que tem como objetivo instituir um sistema de colaboração entre governos no que se refere a questões técnicas que interessam à navegação comercial internacional, bem como encorajar a adoção geral de normas relativas à segurança marítima e à eficácia da navegação.

A segurança marítima melhorou muito desde o naufrágio do Titanic, embora cada desastre marítimo subsequente seja outra chamada para melhoramentos na segurança. Avanços na tecnologia e regulação têm ajudado, mas como a indústria continua a crescer, novos riscos continuam a surgir.

A Organização Marítima Internacional (IMO) celebrou, em 2012, na sede em Londres, o Dia Marítimo Mundial com o tema ( IMO Cem anos depois do Titanic ), em uma abordagem sobre a segurança da vida no mar. Em regra, essa comemoração é uma forma de lembrar a importância da segurança na navegação marítima e acontece todos os anos, com o objetivo de realizar um balanço da evolução da segurança marítima, analisar as áreas mais deficientes e criar um programa de prioridades para os próximos anos.

Coincidência ou não, o naufrágio do Costa Concordia veio ao encontro deste evento. Com a ocorrência, o destino lançou um alerta para a comunidade marítima internacional, organizações internacionais, nações e sociedade civil, de que passados cem anos, o ser humano ainda tem muito que aprender com os próprios erros.

O Titanic jaz a 3.657 metros de profundidade. Não há luz. É um lugar tranquilo, pacífico e apropriado ao descanso dos restos da maior tragédia dos mares. Que assim seja, e que Deus abençoe as almas que encontramos. Robert Ballard

23032021

Como Manter Viva A Memória Do Titanic

Nas últimas semanas, sem querer ( ou não ), acabei instigando a curiosidade do meu sobrinho de apenas três anos, pela história do Titanic. Tudo começou quando apresentei a ele o livro ( A Viagem do Titanic, Um navio inesquecível, uma tragédia histórica ) de Duncan Crosbie. O livro é ricamente ilustrado com pop-ups e reproduções de documentos do ano de 1912 e conta a história do navio sob o olhar do menino Jack, que escreveu todas as suas impressões de sua grane aventura em um diário ficcional. De fato, uma opção interessante para as crianças.

É claro que brincadeira vai, brincadeira vem e decidi mostrar a ele algumas cenas do filme Titanic de James Cameron ( 1997 ). Para a minha surpresa, ele ficou ainda mais empolgado e já está até aprendendo a acompanhar a música tema My Heart Will Go On interpretada por Celine Dion. Além disso, ele faz questão de pontuar diversas vezes que não gosta da cena em que o navio bate no iceberg e já me fez perguntas um tanto intrigantes, como por exemplo, ( Por que o Titanic afundou? ) ou ( Por que não tiram o Titanic do fundo do mar ? )

Em meio a essas vivências com alguém tão jovem que pode não ter a oportunidade de assistir a documentários ou mesmo contemplar imagens e gravações dos futuros destroços submersos, me peguei refletindo sobre esta questão, ( O que podemos fazer para manter viva a memória do Titanic para as próximas gerações ? )

O Titanic se encontra há quase quatro mil quilômetros de profundidade estando submetido a condições extremas como pouca luz e alta pressão o que acelerou bastante seu processo de degradação. É sabido também que o que restou dos destroços, está sendo destruído por fortes correntes oceânicas, pela corrosão salina e por bactérias que consome metais.

A icônica banheira do quarto, fotografada nas primeiras expedições em 1985, por exemplo, já não existe mais devido a esses processos de desaparecimento.

O naufrágio em si é a única testemunha que temos atualmente do desastre do Titanic, disse Robert Blyth, curador do National Maritime Museum, em Greenwich, na Inglaterra a uma entrevista à BBC, ressaltando como é lamentoso o futuro que nos aguarda sem os resquícios do que um dia foi sinônimo de grandeza e exuberância.

Ainda não há como prever exatamente em quanto tempo o Titanic irá desaparecer por completo, isso pode variar de vinte a cem anos. Tudo depende das alterações ou não das condições as quais o navio está submetido.  De qualquer forma, devemos nos acostumar com a ideia de que os restos da embarcação devem sumir nos próximos anos.

Assim, acredito que uma das formas de manter viva essa memória seja através desses diferentes tipos de conteúdos os quais encontramos para todas as idades como livros, filmes, documentários, animações ou mesmo diversas referências presentes em gibis, séries, vídeos ou até mesmo memes que circulam pelas redes sociais.

Além disso, o que de fato irá comprovar a existência do Titanic após o seu desaparecimento, fisicamente falando, será o trabalho de preservação e conservação dos artefatos encontrados em seu sítio arqueológico. Hoje, muitos deles estão expostos em diversos museus pelo mundo como o Titanic Belfast na Irlanda do Norte, o Titanic Museum Attraction e o Titanic, The Artifact Exhibition Las Vegas, ambos nos Estados Unidos.

Os museus tendo esse importante papel de adquirir, conservar, investigar, expor e divulgar os testemunhos materiais do homem e de seu entorno, para educação e deleite da sociedade, certamente irão garantir que os objetos encontrados em meio aos destroços do Titanic sejam admirados pelos futuros entusiastas e curiosos por essa história que continua gerando fascínio todos os anos. É evidente que este é um tipo de entretenimento não acessível para a maioria das pessoas, o que futuramente poderá se tornar uma importante pauta entre os interessados em também manter esta memória.

Em suma, não há dúvidas que o trabalho minucioso de James Cameron na produção de Titanic, um marco do cinema, irá para sempre estimular a curiosidade do público para saber mais o que há por trás dessa tragédia ainda cercada por tantos mistérios. Digo isso levando em consideração minha própria experiência de vida, que começou com a minha irmã mais velha me apresentando ao filme quando eu tinha oito anos de idade e hoje, tenho a oportunidade de poder fazer o mesmo com o meu sobrinho. E mesmo que ele não se torne um entusiasta tão fissurado quanto eu, para mim é suficiente que ele saiba que algum dia existiu um navio chamado RMS Titanic que afundou após colidir com um iceberg.

12032021

O Naufrágio do Titanic Uma Metáfora Para A Sociedade

Antes da eclosão de duas guerras mundiais, os avanços tecnológicos alimentavam promessas de um futuro sonhador para a espécie humana. O Titanic representava um desses marcos do domínio do homem sobre a natureza na era industrial.

No entanto, devido ao seu destino trágico, sua história permanece viva no imaginário popular, sendo uma parte dela em decorrência do famoso filme de James Cameron de 1997, mas que são envolvidas somente até as últimas cenas, enquanto outra parte, a dos entusiastas e curiosos, que provavelmente sempre se questionaram como um navio, símbolo da tecnologia no século XX, afundou em sua viagem inaugural ?

Desde que seus destroços foram encontrados em 1985 pela equipe do oceanógrafo Robert Ballard, os pesquisadores ficaram cada vez mais instigados a tentarem compreender o que levou o maior navio do mundo a colidir com o iceberg e afundar naquela noite fria de abril de 1912.

Graças a esse mistério que ainda hoje envolve a tragédia, temos acesso a diversos documentários ou mesmo as produções cinematográficas que revelam uma série de circunstâncias que se combinaram de forma trágica desde os detalhes equivocados previstos na planta do Titanic até a noite do naufrágio.

A partir de análises realizadas no casco submerso, diversos documentos oficiais e relatos dos sobreviventes, tudo indica que o naufrágio poderia ter sido evitado, sendo a principal causa da tragédia, a falha humana. Porém, esta não foi protagonizada por apenas um ou dois indivíduos, mas um conjunto de erros dos quais seus respectivos responsáveis não deram importância às ameaças de segurança. A confiança imposta numa máquina superou a ética daqueles que deveriam ter tido atitudes e não tiveram. 

A questão é que tudo começa muito antes; antes da White Star Line ser completamente absolvida pelo Inquérito Britânico, antes dos vigias estarem despreparados trabalhando sem binóculos, antes de o Capitão Smith ignorar diversos alertas de icebergs, antes da supérflua inspeção que mesmo com um incêndio acontecendo em uma das carvoeiras e com número de botes salva-vidas insuficientes permitiu que a viagem acontecesse, antes de William Pirrie, Thomas Andrews e Alexander Calisle usarem matéria-prima barata para a construção do casco devido à carência de rebites de adequados, dentre essas e diversas outras falhas, tudo começa com a razão pela qual os navios da Classe Olympic foram idealizados: Devido à concorrência entre duas linhas marítimas, a Cunard Line e a White Star Line.

Um artigo publicado em 18 de abril de 1912 no jornal judaico americano Forward, quatro dias depois do naufrágio, resume a angústia do mundo ocidental, às vésperas da Primeira Guerra, diante do avanço do capitalismo industrial. Para o articulista Ab Cahan, a culpa pelo naufrágio ( é do espírito apressado do capitalismo selvagem ), que busca a acumulação desenfreada de riqueza no menor espaço de tempo possível. ( A vida sob o capitalismo emula essa competição ), lamenta o autor, ( Tempo é dinheiro. E dinheiro é tudo. Aparentemente, economizar tempo é mais importante que salvar vidas ). O texto termina com uma reflexão sobre os limites do capitalismo ( O Titanic é um símbolo para toda a humanidade. Somos todos passageiros ).  

O Titanic reuniu muito luxo, porém em contrapartida algumas medidas de segurança. Diante de tanta lei descumprida e avisos ignorados, não é equívoco dizer que o destino do navio era inevitável. Mesmo passados cem anos, é evidente que a arrogância humana continua a mesma. Segundo o filósofo Jean-Jacques Rousseau ( o ser humano nasce bom, mas a sociedade o corrompe ), essa frase nos leva a crer que o ser humano precisa se adaptar à realidade em que vive para atender às expectativas a fim de alcançar o sucesso, e às vezes seria contra sua verdadeira essência, mas acaba se tornando uma necessidade. As leis podem ser aprimoradas, mas não podem deter aquele sentimento ( indestrutível ) que o ser humano carrega.

Não é à toa que o Titanic frequentemente aparece representado por memes, vídeo e demais representações cômicas para ilustrar diversas situações que ocorrem no Brasil e no mundo. Afinal, quantas catástrofes poderiam ter sido evitadas se o ser humano aceitasse minimamente a possibilidade de dar errado ? Quantas vezes desconsideramos avisos e mais avisos e continuamos tratando uma pandemia como se fosse um ( simples resfriado ) ?

Por fim, em tempos de paz, creio que nenhuma tragédia foi tão enigmática, traumática e tempestuosa para as vítimas e para o mundo como foi o naufrágio do Titanic que mesmo depois de cem anos ainda desperta nosso interesse e curiosidade. Outro século vai passar sem que saibamos toda a história, pois sempre é possível que surja um novo documento, ou depoimento, ou pesquisa com os restos do navio. Isso é só um dos elementos que garantem que o desastre continue sendo tão fascinante.